domingo, 24 de outubro de 2010

Dizer "não" sorrindo


Imagem de Francine Van Hove


Sentada à mesa, vontade de escrever não falta. Mais de meia-noite, um final de semana agitado, nada a perder a não ser as horas de sono, véspera de segunda-feira. Pensar no que poderia dizer a alguém nestas horas pode ser cruel comigo mesma, penso eu.

Levanto, olho os objetos da sala, quadros e livros, tudo parece perfeitamente combinado, mas um vazio ainda habita esta sala de estar. Tantos sofás para quê? Vou ao quarto. Deitada, penso no que poderia ter sido a noite anterior se não tivesse dito "não". Aprisionada novamente pelos meus valores extremamente puritanos que chocam-se com os desejos mais naturais de querer dizer quase sempre "sim".

Aprendi que não pode-se dizer "não" sorrindo. Eles retornam e voltam mais ambiciosos. É neste momento que usa-se todo o repertório educado de dizer "não" sorrindo ou virando o rosto para o outro lado, mas ainda assim, eles retornam como fantasmas.

Sozinha estou. Sozinha com os meus fantasmas, eles contam como companhia? Se alguém telefona e pergunta se pode vir aqui, o que eu respondo? "Não dá, estou acompanhada". É quase instintivo, dizer "não" querendo dizer "sim". Tantos sofás, uma cama, o tapete da sala... tantos "nãos" para quê? 

5 comentários:

Thiago Quintella de Mattos disse...

Tantos sofás, e sofás são para tantas gentes... para quê? Ah, sei lá. Enquanto as pessoas não chegam, esticamos os pés e ocupemos um sofá, pelo menos um.
Ps: Adorei seu comentário lá no meu Blog, Escafandrista!

Gonçalo disse...

Possivelmente vários "nãos" sensatos!

Cuida-te e mostra-te a quem realmente merece :)

Beijinhos***

Leandro Luz disse...

Saber dizer 'não' é muito importante.
O problema é quando o 'sim' toma uma proporção muito grande dentro da gente. De vez em quando é bom seguir o conselho dos nossos amigos 'Pullovers': "...pra que querer ser um mártir se faz parte do momento se entregar?".

Beijo;*

Mar disse...

Você tem realmente belíssimos textos. Eis mais um! Esse quê de realidade nele nos leva a lê-lo novamente, na expectativa de descobrir se você se abriu ou se poetizou em prosa... O “não” dos sozinhos é, normalmente, o desejo de apenas um “sim” no meio de tantos possíveis “sins” substitutivos... E aquele “sim” que (ah!) daríamos sem piscar é para nós um “não”. Então carregamos vários “nãos” para os “sins”, e um frustrado “sim” para o “não”.
Enquanto isso, sofás são muitos, tapetes não fazem sentido, a cama não atrai... Então, pra quê? Ora, cedo ou tarde será preciso mudar um “não” nosso de lugar com o nosso absoluto “sim”, não simplesmente por trocar, ou por substituição de emergência, mas por decidida investida em um advérbio de afirmação da nossa felicidade.
Beijo carinhoso, escafandristinha
Lello

Lufe disse...

É preciso tomar coragem, esquecer os falsos pudores e preencher com alegria o sofá da sala de estar....

Lindo texto

bjo