sexta-feira, 31 de julho de 2009

Camafeu

Depois de tanto pranto
Eu cedi aos teus encantos,
Me abri como camafeu.
Como ostra ferida
A pérola produzida era um bem teu.
Ah, que sorte a minha ser tua querida
Ser poesia perdida no teu breu.
É que nos teus braços eu dormi desprovida
De qualquer medo meu.
Nem nos meus sonhos de menina
A vida seria boa assim como se deu.
Ah, que sorte a minha ser tua querida
Navegar perdida no teu eu.

Véus

Rasgando o véu do silêncio
O sentimento rompe a noite triste
Que perdure então a cor púrpura nos teus olhos
Eu não quero deixar-te jamais
Eu vi-te atravessar os espelhos d´água
Eu vi-te atravessar as horas
Eu vi-te e isso foi-me o bastante
Rasgando o véu do silêncio, dos medos, das horas
O coração transforma-se
Eu ousei ver-te
Eu ousei inventar-te
Que perdure então a cor dos teus espelhos nos meus olhos
Pois eu ousei abrigar-te em minh´alma
Repousa, bebe e ostenta sobre todos os véus
Eu ouso amar-te.

terça-feira, 28 de julho de 2009

Interrogaçoes

O que é a nossa vida diante do tempo?
Somos feitos de quê?
Da mesma matéria de que é feito todo o Universo, eu sei.
Somos parte minúscula de um todo intangível, imenso, ilimitado.
Como partes, nao somos por isso fragmentos.
Somos todos, somos inteiros. Mas e a nossa vida?
Será uma página de um livro sem fim?
Quem somos nós a partir do momento em que nos percebemos
Como passageiros, viajantes, temporais?
E a vida que passa como ondas... que será além disso?
Como dar sentido a algo que está se (re)construindo o tempo inteiro?
Como definir, ou por quê definir, algo que é por natureza
Indescritível?
Desculpem a quantidade de interrogaçoes nesta mensagem, mas estou aqui pra isso mesmo... para (me) questionar.
Se alguém tem a resposta?
Eucreio que sim, eu mesma tenho as minhas
Mas é difícil mesmo achar quem esteja satisfeito com as próprias conclusoes.

segunda-feira, 27 de julho de 2009

永远不会忘记

Nunca esquecer

Nunca esquecer as brincadeiras da infância
A cadeira de balanço dos avós
As músicas de ninar
Nunca esquecer os gostos dos bolinhos com café
Dos banhos de chuva e de mar

Nunca esquecer o primeiro namorado
O primeiro diário, o primeiro beijo
O primeiro palpitar no peito

Nunca esquecer das horas de sono perdidas
Das fantasias vividas
E da ânsia pelo novo e por tudo o que ainda está por ser
Nunca, nunca, nunca esquecer

quarta-feira, 22 de julho de 2009

A sombra dos deuses

Hoje é meu penúltimo dia aqui em Lisboa e (nossa!!!) como gostei dessa terra!

Aqui consegui até ir à praia, algo que eu estava sentindo muitissima falta, mas o mais essencial mesmo disso é que encontrei exatamente tudo o que vim buscar aqui.

Não sei se vocês sabem aquela sensação de "missão cumprida"... É essa a sensação que tenho com relação a Portugal. Fui muito bem recebida, fiz amizades que, bom, não sei se vão durar, isso é o tempo quem vai dizer... mas conheci pessoas singulares, extremamente abertas, carismáticas e sinceras. (Terra boa essa do poeta... Anseio por voltar).

Uma dessas pessoas foi alguém muito especial chamada Rachel, que me presenteou com o livro de Ricardo Reis chamado "A sombra dos deuses".

Eu ainda nem pude lê-lo, mas já abri, folheei e me reservei aquela ânsia do descobrimento! Acho que estou esperando um momento propício, afinal, será de fato meu primeiro encontro com Ricardo Reis.

Bom, esse é outro heterônimo de Fernando Pessoa, assim como Alberto Caeiro. Dizem que esse é o "autor-personagem" de Pessoa que busca a felicidade através da apreciação do momento -- leia-se "carpe diem" -- mas que é extremamente triste. Abaixo, um poema de Ricardo Reis. Espero que tenham um bom mergulho vocês também.


Vem sentar-te comigo, Lídia, á beira do rio
Sossegadamente fitemos o seu curso e aprendemos
Que a vida passa, e não estamos de mãos enlaçadas.
(Enlacemos as mãos).
Depois pensemos, crianças adultas, que a vida
Passa e não fica, nada deixa e nunca regressa,
Vai para um mar muito longe, para ao pé do Fado,
Mais longe que os deuses.
Desenlacemos as mãos, porque não vale a pena cansarmo-nos.
Quer gozemos, quer não gozemos, passamos como o rio.
Mais vale saber passar silenciosamente
E sem desassossegos grandes.
Vem sentar-te comigo, Lídia, á beira do rio.
Sem amores, nem ódio, nem paixões que levantam a voz,
Nem invejas que dão movimento demais aos olhos,
Nem cuidados, porque se os tivesse o rio sempre correria,
E sempre iria ter ao mar.
Amemo-nos tranquilamente, pensando que podíamos,
Se quiséssemos, trocar beijos e abraços e carícias,
Mas que mais vale estarmos sentados ao pé um do outro
Ouvindo correr o rio e vendo-o.
Colhamos flores, pega tu nelas e deixa-as
No colo, que o seu perfume suavize o momento
Este momento em que sossegadamente não cremos em nada.
Pagãos inocentes da decadência.
Ao menos, se for sombra antes, lembrar-te-ás de mim depois
Sem que a minha lembrança te arda ou te fira ou te mova,
Porque nunca enlaçamos as mãos, nem nos beijamos
Nem fomos mais do que crianças.
E se antes do que eu levares o óbolo ao barqueiro sombrio,
Eu nada terei que sofrer ao lembrar-me de ti.
Ser-me-ás suave á memória lembrando-te assim – á beira – rio,
Pagã triste e com flores no regaço.

Ricardo Reis

segunda-feira, 20 de julho de 2009

Quintana por um escafandro

"Quem faz um poema abre uma janela.

Respira, tu que estás numa cela abafada,
esse ar que entra por ela.
Por isso é que os poemas têm ritmo
- para que possas profundamente respirar.
Quem faz um poema salva um afogado."

Mário Quintana

Conselho do poeta

"Esquece todos os poemas que fizeste. Que cada poema seja o número um."

Mário Quintana

sexta-feira, 17 de julho de 2009

Dormir

Vou deixar a porta entreaberta.
Talvez você queira entrar.
Quando chegar, por favor,faça barulho,
Eu quero sentir o coração palpitar.
Vou deixar o abajour desligado,
Vou fingir dormir sono pesado.
Pra quando você chegar a gente dormir.
Posso até fingir tremer de frio, vou fingir arrepio.
Vou me cobrir dos pés à cabeça,
Esperando que você me aqueça.
E quando você lembrar
Do que eu fiz pra você me beijar, por favor, esqueça.

Olhos nos Olhos

Essa é a letra da música de Chico Buarque, que eu amo de paixão. Estava vendo uns vídeos e achei que alguém poderia gostar de ver esse vídeo do Chico cantando Olhos nos olhos e fazendo alguns comentários sobre a composição da música. Devo fazer um post depois sobre isso, estou com uma obsessão por olhos...

Bom, e pra quem gosta só de poesia, a letra da canção está ai embaixo. Bom mergulho!

Olhos Nos Olhos

Composição: Chico Buarque

Quando você me deixou, meu bem
Me disse pra ser feliz e passar bem
Quis morrer de ciúme, quase enlouqueci
Mas depois, como era de costume, obedeci

Quando você me quiser rever
Já vai me encontrar refeita, pode crer
Olhos nos olhos
Quero ver o que você faz
Ao sentir que sem você eu passo bem demais

E que venho até remoçando
Me pego cantando, sem mais, nem por quê
Tantas águas rolaram
Quantos homens me amaram
Bem mais e melhor que você

Quando talvez precisar de mim
Cê sabe que a casa é sempre sua, venha sim
Olhos nos olhos
Quero ver o que você diz
Quero ver como suporta me ver tão feliz

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Poesia Sideral

Da minha dor eu faço poesia,
Faço disso minha alegria
Eu danço em meio a versos de melodia banal.

Eu ando vacilante,
Numa ambivalência constante,
Segredos de um universo ancestral.

Eu canto sobre a pedra fria,
Falo da minha nostalgia,
Faço disso meu testemunho sentimental.

Eu escrevo sobre um mundo que eu vejo distante,
Faço isso num instante
Enquanto os dias passam no meu calendário oriental.

Mas sei que de nada valem os meus dias,
O tempo passa por vias
Que não me conduzem ao essencial.

Então eu sigo inconstante
Dançando por linhas oscilantes
Dos versos de uma poesia sideral.

Poesia torta

A vida agora acordou.
Alguém me diz os planos pra esse dia,
Mas que ousadia,
Ninguém me diz o que fazer.
Eu quero o orvalho da manhã,
Eu quero a mistura das cores todas em mim.
A vida agora acordou e eu vou fazer uma poesia torta
Pra essa vida morna poder se mexer.
Alguém me diz os planos pra esse dia,
Mas que ousadia,
Ninguém me diz o que fazer.

Isn't she lovely?



Olá, amigos. Esta é a primeira vez que falo diretamente com os leitores do blog (cem almas salvaram-se do purgatório, Amaterasu saiu da caverna!).

Bem, este blog era pra ser profundo mesmo como o mar, intenso como um mergulho, cheio de surpresas e descobertas. Sempre achei que fazer do blog o meu diário de aventuras o faria perder seu sentido essencial, mas estou tão feliz com as novas descobertas, os mergulhos, as poesias, as visitas de vocês aqui... ando tão feliz que tive que fazer isso. Então lá vai!

Semana passada conheci Cascais. Tive o prazer de ouvir Marcelo Miranda cantar Isn't she lovely e uma música que ele compôs com o Jorge Vercilo. Infelizmente o vídeo eu não posso postar. Mas achei incrível conhecer o trabalho dele e da esposa, que já estão aqui em Portugal há anos. O Marcelo tem uma forma lindíssima de compor, as letras, as músicas, tudo soa doce, é incrível. Ele musicou diversas faixas do cd do Márcio Catunda e basta a música começar e já dá pra reconhecer o dedo do Marcelo nas músicas.

E como a vida é ainda mais surpreendente, hoje eu realizei algo que pra mim foi maravilhoso. Recebi o convite pra dar uma aula para um grupo maior de 65 anos, hoje em Estoril. Achei que seria uma aula de campo normal, como todas as outras, mas não consigo achar nada mais normal na minha vida. Vejam só vocês: saí às 08:08 da manhã para dar aula, cheguei à praia de Tamariz em Estoril e dei aula de Sintonia e Cosmodinâmica (Yoga Chinesa e Pa-Kua Tai Chi) ao lado de um castelo de algumas centenas de anos, com os pés enfiados numa areia geladinha, em frente ao mar manso e gelado. A sensação... eu nem consigo descrever, aliás, sinto que fico em débito com as palavras sempre que tento dizer o quanto estou feliz com tudo isso. Abaixo, algumas fotos de Estoril.
(Mergulhem como quiserem, minha experiência agora está compartilhada com vocês). Abraços grandes.

terça-feira, 14 de julho de 2009

Poema do mar revolto

Era como um barco que ia
De encontro às pedras.
Já nos encontramos então.
Senti a dor como se cada madeira que me compunha
Se desfizesse em farpas.
O vento me levou para longe do cais,
Minhas velas rasgaram-se todas,
Eu cria que me seguirias
Em meio a todos os temporais.
Mas o mar engana, meu bem.
E o coração de quem ama,
Eu sei,
Perde-se nos vendavais.
Vimo-nos.
O coração não acelerou,
Os olhos não brilharam,
As horas não passaram,
Mas eu permaneci ali.

Poema das palavras vazias

Não queria falar aqui do coração partido
Das noites de sono frágil
Das horas ditas e perdidas
Das palavras desperdiçadas ao vento.
Preferia falar dos bons momentos
Das horas de entrega
Daquilo que aquecia o peito
Como se algo ardesse ali
Noite e dia.
Queria falar daquilo que nos tirava o sono
Que nos fazia entregues ao abandono
E do que padeciamos com tamanha alegria.
Ai, como eu queria falar de ondas mais brandas,
Daquilo que aquecia o coração.
Mas com que tão grande pesar é perceber
Que o mal do que estava a padecer
Era mesmo minha própria ilusão.

quinta-feira, 9 de julho de 2009

Sobre o tédio

Quem passou? O tempo ou eu? Fui eu que passei pelo tempo ou foi ele que passou por mim? afinal, eu vou embora e ele vai ficar aqui pra sempre... Porque com uma vida tão maravilhosa às vezes nos sentimos como se o tempo estivesse parado, sentado na sala de estar? Com tantos compromissos, tantas horas marcadas, tantas pessoas indo e voltando, tanto o que fazer... como ainda conseguimos sentir o tédio? Que mal será esse? Será que tem remédio? Dizem que o tempo é remédio pra tudo que é ferida, mas, porra, ele continua sentado ali na sala, sem fazer nada! E eu aqui, sem saber se passo ou se espero o próximo trem chegar.

Lembro agora da forma como escreveu Natércia Campos sobre as percepções de uma casa! E com que inigualável maestria ela descrevia cada espaço, cada viga, cada madeira a estalar numa casa. Como eu queria aquele poder de expressão agora. Alguns diziam que era o tédio que fazia a mulher escrever falando como se fosse uma casa. Ai que tédio bom esse! nada melhor do que o tédio para nos fazer escrever. Aliás, desculpem meus amigos escritores, poetas e cientistas que adoram seus trabalhos acadêmicos, mas nós somos mesmo um bando de entediados! Nunca vi alguém que realmente tivesse motivos pra sofrer que não tivesse um minuto de tédio para escrever sobre as suas impressões mundanas. Quem tem amor por esse ofício acaba arranjando alguma questão existencialista sobre a qual possa escrever, nem que sejam duas míseras linhas. Ai, o tédio! O que seria de nós se não fosse esse vazio na alma e o tempo ali sentado com cara de sono...